Como a metade de nossa vida se passa no sono, onde nós próprios reconhecemos que não temos nenhuma ideia do verdadeiro, e tudo que sentimos não é mais que ilusão, quem sabe se essa outra metade da vida em que pensamos estar acordados não é um outro sono um pouco diferente do primeiro, e do qual despertamos quando julgamos dormir?
E quem duvida que, se as pessoas sonhassem em companhia, e casualmente os sonhos se harmonizassem entre si, o que é bastante comum, e ficassem sós quando acordadas, acreditariam o inverso do que acreditam agora? E finalmente, como muitas vezes sonhamos que estamos sonhando e amontoamos um sonho sobre o outro, não será possível que essa metade da vida em que pensamos estar despertos também não seja mais do que um sonho sobre o qual vêm enxertar-se os outros, e de que despertamos ao morrer; que durante esse tempo conhecemos tão pouco os princípios da verdade e do bem como durante o sono natural; e que esses diferentes pensamentos que nele nos agitam não são, talvez, mais que ilusões, semelhantes ao transcurso do tempo e às vãs fantasias dos nossos sonhos?
Blaise Pascal
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