Em 174, Antônio Raposo de Camargo denunciou Luzia Leme, cujo marido estava havia muitos anos ausente nas minas de Goiás, e que era moradora na vila de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba. Acusou-a de crime de maleficio e contou que a denunciada, por ciúmes, tinha o ameaçado, na frente de uma testemunha, dizendo que o havia de enfeitiçar. E na verdade Antônio, pela festa da Páscoa de 1747, sentiu uma grande dor no coração "com grande frieza por todo o corpo, ficando quase cego". Queixou-se mais ainda: "picadas que se mudam de uma parte para outra, sem sossego algum, quer de dia, quer de noite, com grandes rugidos na barriga e outras muitas moléstias". Para combater o malefício, Antônio recorrera ao negro escravo Mateus, morador na freguesia de Nossa Sanhora de Araritaguaba. Este lhe aplicara defumadouros de folhas de guarapá, esterco de anta e de capivara, e banha de ictipopé. Fizera-o ainda mastigar "uma raiz incógnita".
Luzia confessara a um forasteiro ter enfeitiçado Antônio e numa caixa que tinha em casa guardava um osso de defunto "e um pedaço de pedra parecia ser pedra do Senhor Bom Jesus de Iguape". A denúncia de malefício foi feita perante o vigário da vara da matriz de Itu e o denunciante era solteiro, natural da cidade de São Paulo, filho de um mestre-de-campo. Na época encontrava-se na vila de Sorocaba "sem domicílio certo", sendo portanto provável que se tenha arranchado no sítio de Luzia e com ela estivesse amancebado, provocando depois os ciúmes que tinham levado ao malefício.
Quanto às curas supersticiosas, elas eram em geral denunciadas quando não produziam o efeito desejado. Na vila de Nossa Senhora da Candelária de Itu, o negro escravo João denunciou em 1747 Marcela, escrava de um outro senhor da mesma vila. Supondo que a "enfermidade perigosa" de João fosse resultado de um malefício, seu senhor chamara Marcela à sua casa, pagando-lhe pelo serviço de curar o escravo. A cura se processara "untando-lhe o corpo com certo unguento e repetindo palavras que ele denunciante não pôde entender por ela falar e articular com voz muito baixa". Pusera-lhe nas costas uma ventosa, "com que tirou não somente sangue senão também muitos cabelos e espinhos". Estiveram presentes ao ritual da cura o senhor e sua mulher e também os parceiros de escravidão, todos do gentio da Guiné. Mas o negro João não sarou, nem sequer melhorou de suas queixas, e talvez por isso mesmo denunciou Marcela pelo crime de curar malefícios "por meios ilícitos e supersticiosos".
Na mesma vila de Itu, o vigário da vara encaminhou em 1752 a denúncia referente a Isabel Maria, "tida e havida por curadora de feitiços". Ela se oferecera para curar José de Matos Nogueira "dizendo serem feitiços o seu achaque". O ritual curativo fora o seguinte: primeiro mandou-o despir e de noite lhe fez uns defumadouros "com umas cerimônas desusadas", e por fim aspergiu toda a casa com aguardente de cana. Vendo isto, o doente desistira da cura e resolvera denunciar a curandeira.
Na capitania também havia curandeiros; não eram apenas as mulheres a fazer as curas. O escravo José, da freguesia da Sé da cidade de São Paulo, em 1760 curava supersticiosamente por aquele distrito muitas pessoas enfermas, "persuadindo-as a que as queixas que padecem são feitiços para que tem remédio para os lançar fora e adivinhar quem lhos deu e o lugar em que são escondidos". Pronunciava uma palavras enquanto mantinha um frango preso junto de uma panela e, em seguida, dirigia-se ao lugar onde estavam escondidos os feitiços e desenterrava-os.
No interrogatório das testemunhas, dezenove ao todo, sendo sete mulheres, realizado na vila de Mogi das Cruzes onde o escravo José mais atuara, uma delas mencionou que ele, ao ser chamado para curar D. Antônia Pinta do Rego, que estava enferma, logo disse que seus achaques eram feitiços. Mandou buscar uma panela nova com água, que colocou em cimade uns ossos que pareciam de pássaro. Depois botou dentro um anel de prata ou estanho e começou a dizer umas palavras em sua língua. Sabia quem tnha feito os feitiços, mas não o revelou, e cavando no chão tirou um saquinho de pano onde disse estarem os feitiços. Mas desta cura não resultou nenhum efeito positivo na saúde da doente.
Os rituais amatórios, pelo contrário, eram especialidade feminina. Teresa Leme da Silva, moradora no bairro de Jundiaí, termo da vila de Itu, procurou o vigário da vara desta vila em 1745 para denunciar Francisca Leite, "bastarda do gentio da terra", moradora no bairro de Anhembi. Esta costumava trazer "uns bichos branquicentos com cabeças redondas pretas em um cabacinho pequeno para efeito de atrair aos homens ao amor lascivo e trato desonesto e libidinoso". E revelara a Teresa o modo como procedia: tirava um bicho do cabacinho e punha-o numa caixa, ao mesmo tempo em que nomeava "algum varão de sua afeição com quem queria ter tratos ilícitos". Se o bicho dava "sua dentadinha" na caixa, era sinal certo de que iria conseguir o que desejava. Tal procedimento fora usado com um viúvo que andara amigado com Francisca durante três anos e que depois a largara. Voltara, contudo, para ela graças aos bichos do cabacinho, sustentados "com farinha mastigada passando depois a massa pelas suas partes pudendas".
Luzia confessara a um forasteiro ter enfeitiçado Antônio e numa caixa que tinha em casa guardava um osso de defunto "e um pedaço de pedra parecia ser pedra do Senhor Bom Jesus de Iguape". A denúncia de malefício foi feita perante o vigário da vara da matriz de Itu e o denunciante era solteiro, natural da cidade de São Paulo, filho de um mestre-de-campo. Na época encontrava-se na vila de Sorocaba "sem domicílio certo", sendo portanto provável que se tenha arranchado no sítio de Luzia e com ela estivesse amancebado, provocando depois os ciúmes que tinham levado ao malefício.
Quanto às curas supersticiosas, elas eram em geral denunciadas quando não produziam o efeito desejado. Na vila de Nossa Senhora da Candelária de Itu, o negro escravo João denunciou em 1747 Marcela, escrava de um outro senhor da mesma vila. Supondo que a "enfermidade perigosa" de João fosse resultado de um malefício, seu senhor chamara Marcela à sua casa, pagando-lhe pelo serviço de curar o escravo. A cura se processara "untando-lhe o corpo com certo unguento e repetindo palavras que ele denunciante não pôde entender por ela falar e articular com voz muito baixa". Pusera-lhe nas costas uma ventosa, "com que tirou não somente sangue senão também muitos cabelos e espinhos". Estiveram presentes ao ritual da cura o senhor e sua mulher e também os parceiros de escravidão, todos do gentio da Guiné. Mas o negro João não sarou, nem sequer melhorou de suas queixas, e talvez por isso mesmo denunciou Marcela pelo crime de curar malefícios "por meios ilícitos e supersticiosos".
Na mesma vila de Itu, o vigário da vara encaminhou em 1752 a denúncia referente a Isabel Maria, "tida e havida por curadora de feitiços". Ela se oferecera para curar José de Matos Nogueira "dizendo serem feitiços o seu achaque". O ritual curativo fora o seguinte: primeiro mandou-o despir e de noite lhe fez uns defumadouros "com umas cerimônas desusadas", e por fim aspergiu toda a casa com aguardente de cana. Vendo isto, o doente desistira da cura e resolvera denunciar a curandeira.
Na capitania também havia curandeiros; não eram apenas as mulheres a fazer as curas. O escravo José, da freguesia da Sé da cidade de São Paulo, em 1760 curava supersticiosamente por aquele distrito muitas pessoas enfermas, "persuadindo-as a que as queixas que padecem são feitiços para que tem remédio para os lançar fora e adivinhar quem lhos deu e o lugar em que são escondidos". Pronunciava uma palavras enquanto mantinha um frango preso junto de uma panela e, em seguida, dirigia-se ao lugar onde estavam escondidos os feitiços e desenterrava-os.
No interrogatório das testemunhas, dezenove ao todo, sendo sete mulheres, realizado na vila de Mogi das Cruzes onde o escravo José mais atuara, uma delas mencionou que ele, ao ser chamado para curar D. Antônia Pinta do Rego, que estava enferma, logo disse que seus achaques eram feitiços. Mandou buscar uma panela nova com água, que colocou em cimade uns ossos que pareciam de pássaro. Depois botou dentro um anel de prata ou estanho e começou a dizer umas palavras em sua língua. Sabia quem tnha feito os feitiços, mas não o revelou, e cavando no chão tirou um saquinho de pano onde disse estarem os feitiços. Mas desta cura não resultou nenhum efeito positivo na saúde da doente.
Os rituais amatórios, pelo contrário, eram especialidade feminina. Teresa Leme da Silva, moradora no bairro de Jundiaí, termo da vila de Itu, procurou o vigário da vara desta vila em 1745 para denunciar Francisca Leite, "bastarda do gentio da terra", moradora no bairro de Anhembi. Esta costumava trazer "uns bichos branquicentos com cabeças redondas pretas em um cabacinho pequeno para efeito de atrair aos homens ao amor lascivo e trato desonesto e libidinoso". E revelara a Teresa o modo como procedia: tirava um bicho do cabacinho e punha-o numa caixa, ao mesmo tempo em que nomeava "algum varão de sua afeição com quem queria ter tratos ilícitos". Se o bicho dava "sua dentadinha" na caixa, era sinal certo de que iria conseguir o que desejava. Tal procedimento fora usado com um viúvo que andara amigado com Francisca durante três anos e que depois a largara. Voltara, contudo, para ela graças aos bichos do cabacinho, sustentados "com farinha mastigada passando depois a massa pelas suas partes pudendas".
Maria Beatriz Nizza da Silva