Em 1816, a cupidez dos traficantes fazia embarcarem cerca de mil e quinhentos negros a bordo de um pequeno navio. Por isso, poucos dias depois da partida, a falta de ar, a tristeza, a insuficiência de uma alimentação sadia, provocavam febres e disenterias; um contágio maligno dizimava diariamente essas infelizes vítimas, acorrentadas no fundo do porão, arquejantes de sede e respirando um ar pervertido pelas dejeções infectas que emporcalhavam mortos e vivos; e o navio negreiro, que embarcava mil e quinhentos escravos na costa da África, após uma travessia de dois meses desembarcava apenas trezentos a quatrocentos indivíduos, escapados dessa horrível mortandade.
Impressionados com essa perda de homens, que encarecia demais o preço dos escravos, os traficantes sentiram a necessidade de embarcar menos negros de cada vez e de tratá-los mais humanamente; desde então, com efeito, permite-se-lhes a consolante distração de subir diariamente ao tombadilho, cujo ar puro os predispõe a dançar de vez em quando ao som de uma música, que, apesar de sua mediocridade, os encanta ainda, principalmente quando existem negras dançarinas. Noutros dias, essa distração é substituída por exercícios violentos, que os estimulam de um modo geral; entretanto, se alguns se mostram exageradamente tristes, forçam-nos a chicotes, a participar da alegria geral; tristes ou alegres, continuam acorrentados uns aos outros, a fim de evitar revoltas ou suicídios pelo mergulho no mar.
Quando os negros novos chegam, são visitados, apreçados, selecionados como animais; examinam-lhes a cor da tez, a consistência das gengivas, etc., para ter uma ideia do seu estado de saúde; em seguida fazem-nos saltar, gritar, levantar pesos, a fim de apreciar o valor de suas forças e sua habilidade. As negras são avaliadas de acordo com a idade e os encantos.
Esses infelizes escravos, na sua maioria prisioneiros de guerra em seus países e vendidos pelos vencedores, desembarcam persuadidos de que vão ser devorados pelos brancos e se resignam em silêncio a acompanhar o novo dono.
Jean Baptiste Debret
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