Naquele momento, ouviu Thomas chamá-la. O chamado era importante, pois vinha de alguém que não conhecia sua mãe nem os bêbados de quem ela ouvia todo dia comentários obscenos e nada originais. Sua condição de desconhecido o elevava acima dos outros.
E mais uma coisa: havia um livro aberto sobre a mesa. Nesse café, ninguém jamais abrira um livro sobre a mesa. Para Tereza, o livro era o sinal de reconhecimento de uma fraternidade secreta. Contra o mundo de grosseria que a cercava, não tinha efetivamente senão uma arma: os livros que pedia emprestados na biblioteca municipal; sobretudo os romances: lia-os em quantidade, de Fielding a Thomas Mann. Eles não só lhe ofereciam a possibilidade de uma evasão imaginária, arrancando-a de uma vida que não lhe trazia nenhuma satisfação, mas tinham também para ela um significado como objetos: gostava de passear na rua com um livro debaixo do braço. Eram para ela aquilo que uma elegante bengala era para um dândi do século passado. Eles distinguiam-na dos outros.
Milan Kundera
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