24 de junho de 2019

Modelo único


Para que serve minha vida e o que vou fazer com ela? Não sei e sinto medo. Não posso ler todos os livros que quero; não posso ser todas as pessoas que quero e viver todas as vidas que quero. Não posso desenvolver em mim todas as aptidões que quero. E por que eu quero? Quero viver e sentir as nuances, os tons e as variações das experiências físicas e mentais possíveis de minha existência. E sou terrivelmente limitada. Contudo, não sou cretina: incapaz, cega e estúpida. (...) Tenho muita vida pela frente, mas inexplicavelmente sinto-me triste e fraca. No fundo, talvez se possa localizar tal sentimento em meu desagrado por ter de escolher entre alternativas. Talvez por isso queira ser todos — assim, ninguém pode me culpar por eu ser eu. Assim, não precisarei assumir a responsabilidade pelo desenvolvimento do meu caráter e da minha filosofia. As pessoas são felizes – se isso quer dizer contentar-se com o seu quinhão: sentir-se confortável como o pino redondo complacente que se insere num orifício circular sem arestas incômodas ou dolorosas — sem lugar para reflexões e questionamentos. Não me contento, pois meu quinhão é limitador, como o de todo mundo. As pessoas se especializam; acabam por se dedicar a uma ideia; as pessoas “se encontram”. Mas o próprio contentamento que vem de você se encontrar é obscurecido pela constatação de que, ao fazê-lo, não só admite ser esquisita, mas um tipo especifico de esquisita.
 
Sylvia Plath

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