16 de setembro de 2016

Poder coercitivo do Estado


Já faz seis anos que não pago o imposto per capita. Certa vez, fui encarcerado por causa disso, e passei uma noite preso. Por não ter outra ocupação, fui observando as paredes de pedra sólida com dois ou três pés de espessura, a porta de madeira e ferro com um pé de espessura e as grades de ferro que dificultam a entrada de luz, e não pude deixar de perceber a idiotice de uma instituição que me tratava como se eu fosse apenas carne, sangue e ossos a serem trancafiados. Fiquei matutando que tal instituição devia ter concluído, em suma, que aquela era a melhor forma de me usar e, também, que ela jamais cogitara de se aproveitar de meus serviços de nenhuma forma. Pude ver que apesar da grossa parede de pedra entre mim e meus concidadãos, tinham eles uma muralha muito mais difícil de transpor antes de almejarem ser tão livres quanto eu. Jamais me senti confinado, nem por um momento, e as paredes me pareceram um desperdício descomunal de pedras e argamassa. Meu sentimento íntimo me dizia que eu tinha sido o único de meus concidadãos a pagar o imposto. Claro estava que eles não sabiam como lidar comigo e que se comportavam como pessoas mal educadas. Notava-se um erro crasso em cada ameaça e em cada saudação, visto que eles pensavam que o meu maior desejo era o de estar do outro lado daquela parede de pedra. Não pude deixar de sorrir perante os cuidados com que fecharam a porta e imaginaram trancar as minhas reflexões - que os acompanhavam porta afora sem delongas ou dificuldade. De fato, o perigo estava contido nessas reflexões. Já que eu estava fora de seu alcance, resolveram punir meu corpo. Agiram como crianças incapazes de enfrentar uma pessoa de quem sentem raiva e que por isso dão um chute no cachorro de seu desafeto. Percebi que o Estado era um idiota, tímido como uma solteirona às voltas com sua prataria, incapaz de distinguir seus amigos dos inimigos. Todo o respeito que ainda tinha pelo Estado foi perdido e passei a considerá-lo apenas uma lamentável instituição.
Por conseguinte, o Estado não observa intencionalmente o sentimento intelectual ou moral de um homem, mas apenas seu corpo, seus sentidos. É uma instituição carente de gênio superior ou de honestidade, dotada apenas de demasiada força física. Mas eu não nasci para ser coagido. Hei de respirar da forma que eu mesmo escolher. 

Henry David Thoreau

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